Na tarde da última segunda-feira, 24 de janeiro, noticiou-se que o Corpo de Bombeiros de Ijuí havia sido acionado para combater um incêndio, provocado por causas desconhecidas no antigo aterro sanitário, localizado na Linha 6 Leste, próximo ao aeroporto. Tendo em vista o incidente e os relatos de moradores de diferentes locais da cidade sobre a presença de uma névoa ou fumaça no ar, o mestrando em Atenção Integral à Saúde, Lucas Machado Sulzbacher, realizou uma avaliação da qualidade do ar em diferentes pontos da cidade, medindo a concentração do poluente atmosférico Material Particulado (MP).
O MP é um dos compostos presentes na poluição do ar gerada por queimadas, constituído de uma complexa mistura de componentes químicos e físicos variados, que podem ser inalados por humanos e animais. Essas partículas, podem ser divididas de acordo com o seu tamanho (diâmetro aerodinâmico), variando entre 0,1 a 10µm, sendo muito pequenas, por exemplo, quando comparadas a um grão de areia que tem 90µm de diâmetro.
A avaliação foi feita em três pontos da cidade, entre as 20h e 21h30 do dia 24; entre as 8h e às 9h do dia 25; e às 20h do dia 25, em locais onde moradores relataram uma alta incidência de fumaça no ar da cidade.
Na primeira avaliação, os níveis de MP2,5 (chamadas partículas finas menores de 2,5µm de diâmetro) estavam mais elevados no Campus da Unijuí (10 ± 2 µg/m3 de ar) em comparação com o centro da cidade (3,3 ± 1,1 µg/m3 de ar), sendo que os níveis nessas localidades ainda estavam dentro dos limites estabelecidos como qualidade do ar adequada para um período de 24 horas, ou seja, menos do que 15 µg/m3, segundo a Organização Mundial de Saúde em 2021 (OMS 2021).
Já na manhã do dia 25, às 8h, uma nova verificação identificou níveis de qualidade do ar acima do recomendável pela OMS. No campus da Unijuí, a concentração de MP2,5 encontrada no ar foi de 32,3 ± 0,5 µg/m3. No centro da cidade, os níveis chegaram a 166 ± 10 µg/m3, ou seja, aproximadamente 10 vezes maior do que o recomendável. Chama a atenção que a poluição por partículas cobriu literalmente a cidade de ponta a ponta, pois na entrada da cidade, na Avenida Coronel Dico, ponto mais distante do campus da Unijuí, os níveis de MP2.5 também estavam elevados no ar (155 ± 10 µg/m3). Os níveis de partículas de outros tamanhos, maiores e menores, também foram avaliados e também se apresentavam elevados. Felizmente, com a ajuda da chuva e dos ventos durante o dia, na noite do dia 25, ou seja, 24h após a primeira medida, os níveis de MP baixaram para aproximadamente 20 µg/m3 nos três pontos da cidade, porém, seguem com níveis acima do recomendável.
A preocupação em avaliar a qualidade do ar do estudante de mestrado está conectada com pesquisas desenvolvidas pelo Grupo de Pesquisa em Fisiologia (GPeF) da Unijuí nesta área, nos últimos dez anos. O grupo já identificou efeitos oxidativos e inflamatórios em diferentes órgãos de animais de laboratório após a inalação de partículas, mesmo quando em concentrações abaixo do recomendado pela OMS.
O estudante Lucas Sulzbacher destaca que a poluição do ar é composta por diversos componentes gasosos e particulados, sendo que cada um desses promove graves efeitos prejudiciais em diversos sistemas do nosso organismo. A OMS destaca que a inalação de partículas com diâmetro menor ou igual a 2,5µm (Material Particulado Fino) pode ocasionar danos distintos à saúde da população (OMS 2021). Tanto uma exposição crônica quanto aguda ao MP (por exemplo, um dia) está associada a um aumento no risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares como insuficiência cardíaca, aterosclerose e acidente vascular cerebral. Ainda, a exposição ao MP pode acarretar em uma desregulação no metabolismo, promovendo um maior risco para o desenvolvimento de doenças como a obesidade e o diabetes mellitus. Existe, ainda, a associação entre a exposição de curto prazo ao MP e a hospitalização de pessoas com comorbidades por doenças do sistema cardiovascular, respiratório e cerebrovascular. Neste caso, o uso de máscaras devido à pandemia por Covid-19 pode também evitar a inalação destas partículas. Além disso, é recomendável evitar a realização de esforço físico em períodos nos quais a condição do ar não está adequada, evitando o aumento da inalação deste poluente.
Embora esta situação em Ijuí tenha sido um evento isolado, destaca-se que 9 em cada 10 pessoas no mundo vivem em lugares onde a qualidade do ar é considerada inadequada, contribuindo para a mortalidade de mais de 4 milhões de pessoas por ano, principalmente por infarto e acidentes vasculares cerebrais. Para evitar o aumento da poluição global, além de evitar as queimadas, recomenda-se o uso de tecnologias limpas na indústria, melhor gestão de resíduos urbanos e agrícolas, acesso a soluções de energia doméstica limpa, mudança para modos não poluentes de transporte com trânsito urbano rápido, redes de pedestres e ciclistas nas cidades, e aumento do uso de combustíveis de baixa emissão e fontes de energia renováveis sem combustão (como energia solar, eólica ou hidrelétrica).
Para saber mais sobre a pesquisa, entre em contato pelo e-mail gpef@unijui.edu.br.
Locais onde foram realizadas as verificações da qualidade do ar e a distância dos mesmos em relação ao local do incêndio